sexta-feira, novembro 30, 2007

Orçamento participativo de Carnide é referência internacional

Gostávamos de ver o mesmo nas freguesias e concelho da Amadora.
Um dia destes...

A freguesia lisboeta de Carnide tem há três anos um orçamento participativo, para o qual contribuem todos os moradores desde idosos a crianças, num processo que é uma referência a nível internacional

O envolvimento da população faz-se na altura de preparar o orçamento, com sessões públicas e inquéritos, reuniões específicas com idosos e crianças, mas sobretudo ao longo do ano, com uma prestação permanente de contas, contou à Lusa o presidente da Junta de Freguesia de Carnide, Paulo Quaresma (CDU).

Numa altura em que a Câmara Municipal de Lisboa iniciou o seu primeiro orçamento participativo, Paulo Quaresma alertou para o perigo de se «brincar à participação« e diz que na sua freguesia já se colhem os frutos daquela medida, por exemplo, nos níveis de abstenção que se situam entre «5 a 7 por cento abaixo da média da cidade».

«O apelo permanente à participação das pessoas faz com que elas não se alheiem», defendeu.

Na próxima semana, o exemplo de Carnide será analisado num seminário internacional em Paris sobre orçamentos participativos, instrumentos que nasceram na cidade brasileira de Porto Alegre, tendo como referência na Europa o caso de Sevilha, e tiveram a sua primeira expressão em Portugal na Câmara de Palmela.

«Há crianças que pedem um MacDonald's. Então, temos que lhes explicar as competências da junta. Por isso é que este é um processo com uma grande vertente pedagógica», afirmou Paulo Quaresma.

O autarca passou a semana a discutir opções para o orçamento com crianças de três, quatro e cinco anos, que falam do que consideram mais importante para a sua «escola, bairro e freguesia» e depois organizam-se em pequenas «assembleias plenárias».

«Surpreende-nos muito o grau de maturidade que eles revelam», acrescentou. Em vez dos inquéritos que os pais recebem na caixa do correio, convidando-os a contribuir para o orçamento da freguesia, as crianças escrevem ou desenham «cartas de desejos».

Estas formas específicas de participação dos meninos de Carnide inserem-se na vontade do executivo de ter a contribuição «daqueles que normalmente não participam, porque não estão organizados», como os idosos.

Para os idosos, há sessões próprias, dada a dificuldade que alguns revelam em sair de casa ao fim da tarde ou há noite, quando se realizam as reuniões gerais sobre o orçamento.

Inicialmente, eram os homens quem mais participavam nestas sessões, até que a junta organizou uma espécie de baby-sitting, actividades lúdicas para as crianças durante as reuniões, e começou a haver paridade de géneros.

Além das sessões e dos inquéritos, para «picar as pessoas» afirmou Paulo Quaresma, a junta de freguesia concebeu e distribuiu «notas de 95 euros», o valor que cada morador teria para gastar se o orçamento fosse dividido por todos.

A ideia é pôr os moradores de Carnide a pensar onde gastariam os seus 95 euros.

Para que o processo não esmoreça, todos os meses, no boletim da freguesia são prestadas contas e feito o ponto da situação sobre as opções escolhidas em orçamento participativo, além de funcionarem todo o ano "conselhos consultivos" em diferentes áreas.

No início, o executivo liderado por Paulo Quaresma tirou partido do «bairrismo» de Carnide.

«A primeira discussão é aquela em que as pessoas olham apenas para o seu umbigo, para a sua rua e para o seu bairro. Depois, apercebem-se dos problemas das outras ruas, dos outros bairros», contou.

Este é um processo «didáctico» defendeu Paulo Quaresma, em que as pessoas ficam conscientes das competências e das verbas que a junta dispõe, mas também da forma como podem ser parte da solução.

«O problema da recolha de lixo na Quinta da Luz foi resolvido porque as pessoas apresentaram uma fórmula para se resolver», ilustrou.

«Às vezes é apenas uma questão de pedir um estudo. Há vários anos que se falava em mais um mercado na freguesia. Pediu-se um estudo à Câmara que mostrou que isso não era viável. As pessoas entenderam» acrescentou.

No entanto, Paulo Quaresma disse que o orçamento participativo «não é uma forma de desresponsabilização» dos eleitos.

«O facto de eu discutir com as pessoas até me dá mais responsabilidades. As pessoas exigem mais porque sabem que eu não posso alegar desconhecimento de causa», afirmou.

O autarca defende que o orçamento participativo não é um «muro das lamentações», como o que considera terem sido das três sessões promovidas pela Câmara para ouvir as populações sobre o orçamento de 2008.

«Ali não se está a promover participação nenhuma. A Câmara decidiu ouvir as populações, o que é legítimo e louvável, mas não é um orçamento participativo», critica.

Segundo Paulo Quaresma, o que a autarquia lisboeta fez foi «pedir aos mesmos de sempre, àqueles que normalmente já participam para participarem», referindo-se às sessões organizadas para ouvir comissões de moradores, associações de pais, conselhos executivos, juntas de freguesias e colectividades.

«A população em geral, que não está organizada nem quer estar organizada, mas tem uma opinião, não é chamada a participar neste orçamento. Desde logo porque as sessões que se fizeram foram muito mal divulgadas até para aqueles que foram convidados, quanto mais para a população em geral» argumentou.

Para o autarca, «corre-se o risco de brincar à participação e hipotecar-se um processo que é nobre porque se lhe retira toda a credibilidade».

O orçamento participativo da Câmara de Lisboa foi lançado a partir de uma proposta do vereador do Bloco de Esquerda, José Sá Fernandes, e segundo o presidente, António Costa (PS), tem um primeiro ensaio na escolha das opções para 2008 mas deverá concretizar-se em pleno quando for discutido o orçamento para 2009.

Além de três sessões públicas, que já se realizaram, os munícipes podem participar através da Internet, no sítio http://lisboacontaconsigo.cm-lisboa.pt.

Fonte: Agência Lusa

3 comentários:

anabananasplit disse...

Não sabia de tal iniciativa tão louvável e bem-sucedida cá por terras lusas. Obrigada por divulgares! :-)

RUTE disse...

Isto existe mesmo??? Eu julgava que apenas no meio rural é que o comum cidadão era mais intimo da poder local :-))

Fantástico!! Este é que é o verdadeiro espirito do Natal, todos pensarem e trabalharem em conjunto para uma melhor comunidade.

Anónimo disse...

Aos poucos a semente vai dando frutos...

O poder local no seu melhor...